segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Gregório de Matos, poeta baiano

Que falta nesta cidade?... Verdade
Que mais por sua desonra?... Honra
Falta mais que se lhe proponha?... Vergonha

O demo a viver se exponha,
Por mais que a fama a exalta,
Numa cidade onde falta
Verdade, honra, vergonha.
Quem a pôs neste socrócio*? ... Negócio.
Quem causa tal perdição? ... Ambição.
E o maior desta loucura? ... Usura.

Notável desaventura
De um povo néscio* e sandeu*,
Que não sabe que o perdeu
Negócio, ambição, usura.

[...]

E que justiça a resguarda?... Bastarda
É grátis distribuída?... Vendida
Que tem, que a todos assusta?... Injusta.

[...]

A Câmara (1) não acode? ... Não pode.
Pois não tem todo o poder? ... Não quer.
É que o governo a convence? ... Não vence.

[...]


(1) As Câmaras tinham grande poder no Brasil colonial: arrecadavam impostos, resolviam os problemas das comunidades, mantinham a segurança, estabeleciam relações com os governadores, etc.

*Socrócio: palavra criada pelo autor, indicando roubalheira, rapinagem.
*Néscio: ignorante.
*Sandeu: idiota.


PS: É incrível como, mais de três séculos depois, essas palavras de Gregório de Matos continuam tão atuais.

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